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domingo, 8 de maio de 2011

Aquela pedrinha no sapato...

Pedra, sapato, perspectivas, vida - www.samuelbonette.blogspot.com


Existe uma expressão chamada "pedra no sapato". Normalmente se refere a alguma coisa que impõe dificuldades a outrem. É uma expressão bastante utilizada, especialmente quando em competições. "Fulano é a pedra no sapato do Sicrano" - normalmente é a frase proferida. 

E, de fato, uma pedra no sapato incomoda. Fica aquela situação de desconforto ou irritação intermitente, dói quando pisa, incomoda quando o pé está no ar, é uma sensação horrível. Me lembro até de uma vez na qual um empregado de meu pai relatou que seu pequeno filho estava reclamando de algo dentro de seu tênis, e quando foram ver, era uma aranha que estava dentro do tênis, que por sorte não conseguia se virar para picar seu filho. Evidentemente que uma pedra no sapato é uma situação bem menos perigosa, mas não menos preocupante.

Todavia, o que mais me chama a atenção não é o fato da pedra incomodar tanto, mas sim o tamanho desta pedra. A pedra do sapato normalmente tem um tamanho pequeno. Fora do sapato ela é totalmente inofensiva; não se poderia atirá-la em alguém ou animal, em auto-defesa, pois não surtiria efeito; não se poderia atirar a pedra num pássaro ou ave qualquer, num momento de necessidade, para matar e comer a ave, pois não a abateria. A pedra é pequena demais, tão pequena que mesmo seu peso não seria suficiente para esmagar uma formiga. Não se pode fazer absolutamente nada com esta pedra, a não ser desprezá-la. A pedra no sapato é algo insignificante enquanto pedra.



Porém, esta mesma pedra dentro do sapato incomoda demais. Isto me leva a concluir que, por ser insignificante fora do sapato, desprezamos-na, quando deveríamos entender que ela se torna incomodativa dentro do sapato justamente porque a desprezamos fora dele. Se fosse uma pedra de tamanho considerável, ao vermos a mesma dentro do sapato, imediatamente a retiraríamos, pois com certeza nem seríamos capazes de calçar o sapato. 



Entretanto, por seu pequeno tamanho, nem mesmo a notamos, e se vemos, desprezamos-na. É interessante como algo tão pequeno pode se tornar tão grande. A segunda conclusão que tiro é que a pedra incomoda porque o sapato é do tamanho do pé, ou pouca coisa maior. Se o sapato fosse maior que o pé provavelmente também não incomodaria. A questão é que o sapato é do tamanho do pé, e não há espaço dentro dele para nada além do próprio pé; nem para uma minúscula pedra.

Considerando o sapato como sendo nossos caminhos, e as pedras aqueles obstáculos que encontramos, por diversas vezes o que mais nos incomoda não são as coisas grandes, mas sim as pequenas. No filme "Ele não está tão a fim de você", por exemplo, ocorre uma situação de separação entre um casal porque o esposo esconde de sua cônjuge um velho hábito de fumar, e não porque ele a havia traído. Ela era capaz de perdoar uma traição, mas não o fato de ele esconder um hábito.

Da mesma forma, quando encontramos grandes obstáculos, damos importância a eles, bolamos formas de enfrentá-los, enfrentamos, nos dispomos ao esforço e vencemos; quando não os vencemos, ainda assim reconhecemos que perdemos para um grande obstáculo. Agora, os pequenos nos passam desapercebidos, são desprezados, são ignorados, são perigosamente deixados para depois, e estes são justamente os que por vezes nos derrubam, fazendo sofrer, nos irritando e roubando a paz. 

Estes podem ser da mais diversa natureza: palavras atravessadas, pessoas que nos irritam, diferenças de idéias, times rivais, simples gestos, um quadro torto, enfim, um leque infinito de opções. Precisamos urgentemente remover as pequenas pedras dos sapatos, ou então encontrarmos sapatos maiores. Se não fizermos um ou outro, vamos sofrer demasiadamente por coisas pequenas.

A boa notícia é: não há maior sensação de alívio em nossa caminhada do que uma pedra, a pequena pedra, retirada do sapato.

Samuel Bonette