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segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Alguns segundos e uma vida


Faz tempo que não escrevo; estava sentindo falta; muito provavelmente não consiga atingir meu objetivo, de 12 textos no ano, média de um por mês. Um mês é um tempo muito curto para parecer tão longo; tem apenas quatro ou cinco sábados, quatro ou cinco domingos, um dia de pagamento, um dia de fechamento de folha, apenas um dia 30, então é pouco tempo para escrever. 

Se eu não o faço, entretanto, me intoxico; muitas ideias em ebulição, abstração e objetividade alternada e alternativamente variantes, vou me enchendo do mundo e de seus fatos, inflando e insuflando, parece que me vejo como nos desenhos, saindo vapor pelos meus ouvidos. Lembrei ainda hoje de um fato ocorrida há muito tempo atrás; não poderia deixar de registrá-lo; segue abaixo:

Um dia destes, cheguei para trabalhar mais cedo que o habitual; sete horas e eu já estava no meu ambiente de trabalho. Na sala, apenas eu e minha colega, par de atividades. Sentávamos de frente um para o outro. Estávamos absortos em absoluto silêncio, quebrado apenas por um rádio ligado numa estação de rádio qualquer, no volume mínimo. Eu fazia parte do serviço, ela outro. Estávamos ambos cansados e naquele clima que normalmente acontece de manhã bem cedo, quando ninguém quer falar nada. A cena que vi não durou mais que um minuto, mas foi o suficiente para me intrigar até hoje.

Começou a tocar uma música que até então eu não conhecia; falava sobre um relacionamento aparentemente rompido, em que ambos continuavam suas vidas, mudavam de hábitos, conheciam novas pessoas, entretanto, o amor entre eles não tinha terminado. De um lado, a menina esperava que ele ligasse; do outro, ele até queria ligar, mas tinha medo porque pensava que talvez ela já o tivesse esquecido, conhecido outra pessoa, que desprezaria sua saudade, seu sentimento. Ambos sabiam, porém, que era amor o que sentiam; era amor o que haviam sentido; seria para sempre o registro de um amor, mesmo que um dia acabasse. Entre eles tinha acontecido uma história de amor. Por fim, a música não registrava final feliz.

Durante algum tempo, esta minha colega parou seus afazeres e ficou olhando para o nada, olhar vazio e distante, talvez procurando seus próprios sentimentos dentro das lembranças ou mesmo dentro da música; sobre ela, eu sabia apenas que era casada com alguém que conhecera ainda no colégio, que estava há muito tempo com esta pessoa; sempre fomos muito reservados com assuntos pessoais, mas aquela música tirou-a do normal, fez algo vir a tona; lembranças de um amor adolescente não confirmado, sentimentos de rejeição, impressões íntimas, suspeitas, uma simples reflexão, não sei... até hoje penso no que se passou em sua mente, não consigo esquecer aquele olhar, enquanto soava o refrão.

A música, o lugar e o refrão? Que importa? Você não se reconhece na história e não achas que ela poderia ter acontecido contigo? Tem certas coisas que são universais, e nem precisam ser verdade para que acreditemos que elas realmente aconteceram. Nossas vidas estão aí para ser contadas em alguma música.


Samuel Bonette.